Friday 1 January 2016

Bom ano novo

Onde vos apresento os meus votos e partilho uma ideia de negócios.
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Não me lembro quando pela primeira vez me disseram: Bom Ano Novo! Devia ser bebé e com certeza foi aos meus pais que o desejaram, algures na cidadezinha tropical, bonitinha, costeira, onde vim ao mundo. No tal Ano Novo tinha pouco mais de um mês porque nasci, tal como a ministra da justiça do governo Costa, Art Garfunkel, Frei Damião, Roy Rogers, Ibrahim I, Bernard-Henri Lévy, Art Tatum, Abédi Pelé, Ike Turner, Benjamin F. Butler e Ana Bacalhau, no dia 5 de Novembro. E, facto notável, foi no dia seguinte que Pio XII fez o seu Discurso aos juristas católicos italianos do qual, mesmo se és membro da Igreja Católica Apostólica Romana, aposto que nunca ouviste falar. Sou, portanto, tal como o país onde nasci, Escorpião na astrologia cá da banda, Serpente na dos chineses e, com tanto veneno no corpo, se calhar Tarântula noutro sistema astrológico que desconheço. Só num dia tão peçonhento poderia ter sido eleito Richard Nixon en 1968.  

Não me lembro quem me desejou Bom Ano Novo pela primeira vez, mas lembro-me de quem o fez pela última. Foi há uma hora atrás, uma das meninas dum café onde às vezes vou beber um double expresso allongé, que é uma possante bomba de cafeína que tira o sono mesmo a tipos estruturalmente preguiçosos como eu. Tomo-o sem açúcar para não engordar demasiado e, para recompensar o esforço, ofereço-me um muffin que é uma espécie de queque. Tenho o cuidado de encomendar um muffin de cenoura porque os legumes fazem bem à saúde. É o que hoje te venho desejar. Não o muffin de cenoura com café, mas o Bom Ano Novo cheio de boas resoluções. 

Boas resoluções... Enfim! Bom... Já que falamos disso aproveito para esvaziar o saco!

Há coisas nessas resoluções que me chateiam supinamente por causa do aproveitamento comercial que delas se faz como... Digamos... Um exemplo ao acaso: os ginásios! Oferecem-te pacotes interessantes valendo-se das tais «resoluções do ano novo» e da tua vontade de perderes peso e (ou) melhorares a forma física. Atenção... Não caias nessa! Simplesmente porque não vais conseguir manter o objectivo. As estatísticas aí estão para nos demonstrar que são decisões de pouca dura. Inscreves-te, arrastas-te entre dois aparelhos de musculação, ficas sentado naqueles que têm um banquinho, com ar desconsolado, fazes um penoso sacrifício durante um mês, no máximo três. Se atingires os quatro consideras-te um herói. Bebes cafés amargos, cenouras sem açúcar... Até que um dia encontras desculpa válida para ficares refastelado em fente à televisão, assumindo uma terrível verdade: odeias o exercício com todas as fibras dos teus músculos doloridos. Consequência infalível: desistes! O objectivo dos ginásios é meterem-te a mão no bolso, enquanto dura o teu entusiasmo. E eu, que voltei a renovar a minha inscrição (para abater esta ominosa, perversa, encarniçada barriguinha que mesmo a cenoura do muffin não consegue vencer) lá fico raivosamente a bater o pé, esperando que neófitos bem-intencionados, luzindo no equipamento de treino e sapatilhas de marca oferecidas no Natal, tentam descobrir como lhes regular a tensão.

Todavia, e ilustrando a sapiência dum filósofo anónimo, «o ódio gera o capital», foi numa dessas filas de espera que uma ideia me iluminou as meninges! Revelação que partilho contigo: abrir um local que funcione como ginásio de Janeiro a Abril enquanto duram as resoluções do ano novo (estação do músculo); e de Abril a Dezembro como cervejaria (estação do defeso). Durante a quadra natalícia, aquando da ponta final do mau colesterol e da cerveja, far-se-á promoção dos pacotes para a estação do músculo.

Que dizes, hã? E há quem diga que não tenho costela de empresário.

Quanto aos outros desejos da praxe, «saúde, dinheiro e amor», mudo-lhes a ordem, primeiro o kumbu (*) que te permite encontrar amor e comprar saúde. Aliás, um estudo confirma que os ricos saem da cama mais satisfeitos. Também caí nessa esparrela do amor e uma cabana, mas como não tinha kumbu as namoradas deram-me todas com os pés, excepto a última que deve andar distraída.

Como sou generoso, também te desejo outras coisas. Se fores mulher e precisares de beleza, mira-te no espelho; se és heterosexual e estás fartinha do teu macho, que é ciumento e preguiçoso, rifa-o; se és lésbica não mudes de orientação porque não há melhor coisa neste mundo que a mulher, nós, homens, somos muito feios, complicados, frágeis emocionalmente e difíceis de aturar. Para todos vocês, homens e mulheres, independentemente do vosso sexo, religião, raça, opinião política (desde que não votem no cowboy), nacionalidade, estado civil, recursos financeiros, posição social... Em suma, desde que sejam mais ou menos boas pessoas: se ficares doente, luta; se ficares só, lê; se memórias te afligem, escreve; se algo te deprime, canta; se um amigo(a) te abandonou, vira-lhe as costas; se caíres, levanta-te; se a depressão te afoga, aprende a nadar;  se tens fome, revolta-te! E se te caluniarem, lembra-te da máxima: «não se atiram pedras a árvores que não dão frutos»... Mesmo quando te queixares: «Porra, que algumas deixam mossa!»

OK... OK... Deves estar para aí a dizer: «É mais fácil dizê-lo que fazê-lo». E tens razão! Contudo, aqui vai conselho para os dias sombrios, resultante duma longa experiência pessoal: uma cerveja bem fresca não cura, mas ajuda! Vale também um uísque velho on the rocks, um dry-martini com três azeitonas (conservadas, tal como a garrafa de vodka, no congelador), um gin tónico (nos trópicos), e outros cocktails como caipirinha e pisco-sour, desde que o vidro que os contém venha a escorrer de água condensada (é esse o truque: água por fora, álcool por dentro). E se tiveres de fazer uma cura de águas, proponho-te a velha receita, sempre actual: de manhã, água das pedras; à tarde, água pé; à noite, aguardente, 

Bom Ano Novo...

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(*) Dinheiro em angolês
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© Carlos Taveira



LIVROS ASSINADOS PELO AUTOR DO BLOGUE



Texto Editores, Lisboa, Portugal, Lisboa, 2006, 319p, ISBN : 9789724731452

La traversée des mondes, Roman, Français
Les Éditions L'Interligne, Ottawa, 2011, 576p, ISBN 978-2-89699-392-5

Mots et marées, Roman, Français
Les Éditions L'Interligne, 2014, 560p, ISBN 978-2-89699-392-5.

De la racine des orages, Poésie, Français.
Les Éditions L'Interligne, 2014, 186p, ISBN 978-2-89699-404-5

Mots et marées tome 2, Roman, Français
Les Éditions L'Interligne, 2015, 186p, ISBN 978-2-89699-404-5

A Feather for Pumpkin, Fiction, English
Create Space, 2016, 186p,  ISBN-10: 1519662505, ISBN-13: 978-1519662507

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