Tuesday 1 December 2015

Ministra da justiça

Onde me zango por causa de tanto chinfrim à volta duma ministra da justiça
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Olha, zanguei-me! Todos nós nos zangamos, não é? Por razões diferentes, é verdade. É que por estes dias tem sido muito comentada, por tudo quanto é Facebook e afins, uma notícia anódina: os tugas nomearam uma mulher para a função de ministra da justiça. E depois? Como os outros, parece ser pessoa capacitada devido à sólida carreira, bagagem académica consistente e meritórias realizações profissionais. Diga-se que a vida nem sempre lhe sorriu. Há muitos anos, no país tropical onde nasceu, executaram-lhe irmão e cunhada. De abuso, acredita, nem sequer se deram ao trabalho de inventarem um julgamento. Como este dos 15+2 revus, que há quem diga que é de pimpa, mas pronto, salvaguardam-se as aparências. O tal casal fuzilado deixou filho órfão que a nova ministra educou e, perfecionista como parece ser, seguramente com esmero. Casou com um tuga jurista e lá em casa é fácil imaginar: trata-se por tu o código penal e o civil, decretos-leis, portarias, constituição... Enfim, tudo quanto é lei e (ou) o espírito dela. Ah! Dizem as más-línguas que é muito senhora do seu nariz e que não dá confiança aos subordinados. Será porque é mulher e, sendo-o, assenta autoridade com atitude autoritária a meio dum governo de machos?  

Porque concordas comigo, não é: os tugas fazem fraca figura no que diz respeito à representação feminina no governo. Segundo um artigo do Expresso, em quarenta anos de democracia os machos apoderaram-se de 94% dos ministérios. Tsk, tsk, tsk... E as coisas não melhoraram muito com o último: só há quatro! Por aqui, em terras dos canucks é fifty-fifty. Já agora que falamos nisso... Perguntinha para ti: Qual é o país que tem mais ministras que ministros, hã? Qual é? Não sabes? É Cabo-Verde! Empata com a França. O que não é de admirar: francesas e caboverdianas são mulheres que não se deixam espezinhar sem reagir. Até havia uma que cantava descalça e ninguém lhe pisava o dedo grande do pé. Voilà... Estou a desviar-me do assunto, voltemos à minha zanga e às redes sociais.

Ao princípio não percebi muito bem a excitação que tal nomeação causava. Passava pelas fotografias da nova ministra, via-lhe cara, nome e cargo, e dizia cá para mim, «com esse currículo, é capaz de dar uma boa ministra da justiça, de acordo, mas porquê tanto chinfrim?» Até que comecei a ler comentários, respostas aos comentários, as infalíveis injúrias entre os comentadores...

Chateei-me!

Como dizia, não vi motivo para tanta confusão e, para desabafar, telefonei àquele meu amigo cáustico que se auto-intitula Rebenta-Balões porque é ateu, não acredita na humanidade e se aplica com esmero a destruir símbolos e heróis. Sei que é um erro telefonar-lhe, ele não fortalece a minha auto-estima mas enfim, é um vício falar com ele quando tenho dúvidas e estou deprimido ou zangado. Quando atendeu, insurgi-me logo com a euforia à solta, esse descomedimento de regozijo à volta da nomeação duma mulher ministra. Perguntei-lhe porquê. O safardana riu-se, babado de gozo:
– Eh, pá... Atão não se vê logo? Tá na cara, meu. É exactamente pela mesma razão que te levou a colocar na tua página facebook, em grandes parangonas, a fotografia da ministra da justiça do último governo canadiano. Estavas excitadinho como um deputado a quem aumentaram o ordenado só porque pela primeira vez uma ameríndia ocupava tal cargo! Vem tudo da tua overdose de  politicamente correcto que...
– Bardamerda! - E desliguei-lhe na cara! 

Mais chateado que nunca, voltei às fotos da ministra e outros ministros, observei-as atentamente, escrutinei-as à lupa, e confesso-te que havia algo de especial, de único, nesta ministra da justiça, qualquer coisa de inexplicável que me passava despercebida e que fazia dela um ser aparte. Enfim, ao ler as primeiras linhas dum resumo biográfico... Aleluia! Fez-se luz no meu espírito: Ela e eu festejamos os nossos aniversários no mesmo dia! Escorpião mulher do 5 de Novembro é um ser aparte! Só pode...

Aaaaah! Corruptos, ladrões de colarinho branco, assassinos, calhordas, ladrões de submarinos, biltres, cafajestes, banqueiros venais, arrombas, facínoras, proxenetas, díscolos de todos os azimutes... Aterrorizem-se! O impiedoso porrinho da lei vai abater-se sobre as vossas cabeças depravadas!

Dura lex sed lex.


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_(ツ)_  
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© Carlos Taveira



LIVROS ASSINADOS PELO AUTOR DO BLOGUE



Texto Editores, Lisboa, Portugal, Lisboa, 2006, 319p, ISBN : 9789724731452

La traversée des mondes, Roman, Français
Les Éditions L'Interligne, Ottawa, 2011, 576p, ISBN 978-2-89699-392-5

Mots et marées, Roman, Français
Les Éditions L'Interligne, 2014, 560p, ISBN 978-2-89699-392-5.

De la racine des orages, Poésie, Français.
Les Éditions L'Interligne, 2014, 186p, ISBN 978-2-89699-404-5

Mots et marées tome 2, Roman, Français
Les Éditions L'Interligne, 2015, 186p, ISBN 978-2-89699-404-5

A Feather for Pumpkin, Fiction, English
Create Space, 2016, 186p,  ISBN-10: 1519662505, ISBN-13: 978-1519662507

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